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MANUEL PINTO
Professor Catedrático do Departamento de Ciências da Comunicação
Presidente do Conselho do Instituto

Por um maior protagonismo científico-pedagógico dos estudantes no futuro da Universidade

Pela dinâmica das interações sociais e dos fluxos da vida social, temos assistido à difusão vertiginosa de um vírus singular, que não só se espalha pelos sítios mais distantes como nos vem bater à porta, pelos caminhos mais surpreendentes. Contemplamos diariamente uma ameaça global dada em espetáculo noticioso, mas que pode estar já dentro do nosso círculo de relações, para não dizer dentro da nossa casa.

Em escassos meses as rotinas eclipsaram-se, os alicerces da vida quotidiana foram abalados e o grau de imprevisibilidade cresceu exponencialmente. A saúde, a segurança, as relações sociais e profissionais, a liberdade de circulação, as condições de trabalho, o sentido da vida – tudo passa a ser reavaliado numa outra escala. O cuidado de si e dos outros adquire uma centralidade tal que nele se pode decidir da vida e da morte. 

Mas talvez o que mais se tem agigantado nesta crise pandémica é a brutalidade das desigualdades sociais, das velhas e das novas desigualdades. Os que não podem confinar-se; os que vivem e os que morrem sozinhos; os que perderam ou temem vir a perder o trabalho; os que desatinam com tanta ou tão pouca informação (que, por vezes, é desinformação); os que não sabem como ou a quem pedir ajuda. Aos velhos pobres estruturais, somam-se os novos pobres que vivem na angústia de não saber o que fazer da vida.

Permita-se que sejam destacados dois grandes grupos sociais que são, no atual contexto, aqueles que mais riscos correm: os mais velhos, cada vez em maior número, que vimos, tantos deles, apanhados à má-fila, pelas ondas de choque da pandemia, expondo as chagas medonhas de abandono, descarte e mesmo maus tratos; e, por outro lado, os mais jovens, ainda a restabelecer-se da crise dos inícios da segunda década deste século, que veem o quotidiano subvertido e, o que é bem mais, a precariedade a crescer e o futuro a fechar-se em nuvens negras.

O Instituto de Ciências Sociais, nos seus prometedores 44 anos, vive e age no seio deste verdadeiro tsunami e não vai – não pode – virar as costas aos desafios que estão a emergir. Já agora, mas especialmente quando a vacina surgir e os tempos da emergência amainarem, vão aparecer novas 'linhas da frente', onde se vai construir e decidir o futuro. E, nessa linha da frente, as Ciências Sociais, ao lado de outras ciências, vão ter de assumir um papel de primeiro plano, no forjar de formas que permitam responder à crise e inventar o futuro.

Teremos de nos posicionar como quem tem um papel a desempenhar e não como quem espera que existam as condições tidas por necessárias para exercer esse papel. Nós temos de ser atores desse processo, sob pena de nos tornarmos irrelevantes.

Mais: para que os caminhos a percorrer tenham solidez e sentido, é vital que, na busca de soluções e caminhos, os jovens estudantes sejam parte decisiva, desde a conceção até à realização dos projetos. É preciso dar-lhes espaço e voz, no âmbito pedagógico e científico, porque sem eles como atores no presente pós-pandémico, não podemos esperar que sejam protagonistas do/no futuro.

Claro que um caminho destes supõe uma revolução da e na Universidade. Nos métodos, nos processos, nas formas organizativas, nos recursos, nos tempos e nos espaços. Tem de colocar os estudantes e os desafios sociais no centro das suas opções estratégicas, e não a rentabilidade e o mercado. A Universidade tal como tem vindo a estruturar-se nas últimas décadas está, em grande medida, a preparar estudantes para um mundo que está a ruir ou já não existe. Se quiser tornar-se um ator relevante, vai ter de mexer-se e mexer com muitos interesses instalados. Contudo, ou faz por si essa opção ou será, mais tarde ou mais cedo, forçada pelas circunstâncias a fazê-lo.